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Mas afinal, o que é patrimônio cultural? Gentrificação

Gentrificação, o que é e os impactos que traz a um bairro na Série Mas, afinal, o que é o patrimônio Cultural?

Por *Ana Beatriz Mascarenhas

Você se lembra que no último artigo eu disse que iríamos falar sobre gentrificação? Pois é… Mas o que é gentrificação?

O termo foi usado pela socióloga britânica Ruth Glass, no livro lançado em 1964 – London: aspects of change (Londres: aspectos da mudança), onde descreve o processo no qual famílias de classe média se mudaram para bairros antigos e desvalorizados no centro de Londres, ao invés de se instalarem nos subúrbios residenciais, hábito daquela época. Assim, ocorreu um processo de substituição das camadas sociais – de trabalhadores pela de classe média.

 Gentry em inglês quer dizer classe alta ou dominante: aristocracia; daí o termo gentrification.

Ela se referia ao aburguesamento do centro da cidade, usando o termo irônico gentry , que pode ser traduzido como bem-nascido , como consequência da ocupação de bairros operários pela classe média e alta londrina..

Em português usamos o termo “gentrificação”, mas alguns estudiosos preferem o termo “enobrecimento”. O geógrafo britânico Chris Hamnett define gentrificação como um fenômeno físico, econômico, social e cultural, ou seja, ao se mudar algumas características físicas de um determinado lugar, pode-se provocar uma mudança econômica sobre o mercado imobiliário, alterando assim, a organização social.

Fatores que levam à gentrificação

Cidade mercadoria

Existem muitos fatores que podem provocar esse fenômeno; um deles é a questão associada à competição mundial entre cidades. Otília Arantes, Carlos Vainer e Ermínia Maricato discutem essa questão no livro “A cidade do pensamento único – desmanchando consensos” (2000). Os autores explicam que em função da competição entre as cidades a nível mundial, os governos buscam atrair megaeventos (como a Copa do Mundo, Jogos Olímpicos) que projetam as cidades globalmente, mas que acabam tornando-as mercadorias.  Entretanto, muitas vezes, esses eventos não produzem efeito positivo para a população local a médio e longo prazo. Basta olhar para o legado dos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro.

Turismo predatório

Outro fator que pode estimular a gentrificação é o turismo predatório, ou seja, o turismo em massa que acaba por exaurir os ativos culturais, naturais e sociais. Em outras palavras, o turismo insustentável.

E, como exemplo, cito a cidade de Veneza, na Itália, que se transformou numa Disneylândia Cultural. A cidade recebe, em média, mais de 15 mil turistas diariamente. Com uma população cada vez menor (em função dos altos preços dos imóveis e conveniências) o número de habitantes atual da cidade é semelhante à existente em meados do século XV.  

Poster do documentário The Venice Syndrome (2012).

A gentrificação pode ser compreendida como processo socioespacial que contribui para a injustiça social, um modelo capitalista está sempre criando novos produtos e estilos de vida para a geração de lucro como declara o geógrafo David Harvey. Ele ressalta que, de maneira geral, a qualidade de vida urbana se tornou uma mercadoria, assim como a própria cidade, em um mundo onde o consumismo, o turismo, as indústrias culturais e baseadas no conhecimento tornaram-se os principais aspectos da economia urbana.

Revitalização de bairros antigos

A revitalização de bairros antigos pode também causar a gentrificação. Em função das características históricas e/ou culturais, o mercado imobiliário em parceria com o poder público, adequam esses espaços o gosto do consumidor atraindo camadas populacionais de alto padrão além de estabelecimentos comerciais voltados para essa classe social.

Santa Tereza

A gentrificação poderia ser um dos problemas que Santa Tereza enfrentaria caso a proteção como Conjunto Urbano não fosse efetivada pela Diretoria Municipal de Patrimônio Histórico.

Mesmo que a regulamentação como ADE (Área de Diretrizes Especiais) tenha sido uma grande conquista, as diretrizes contempladas na proteção como Conjunto Urbano Bairro Santa Tereza garantem, de maneira mais efetiva, a preservação do ambiente construído e a conservação de seus modos de vida e ambiência tão caros tanto para os moradores do bairro assim como para a população de Belo Horizonte.

No próximo artigo iremos trazer mais detalhes sobre as regulamentações da ADE e do Conjunto Urbano. Até breve!

Referências

ARANTES, Otília; VAINER, Carlos; MARICATO, Ermínia. A cidade do pensamento único: desmanchando consensos. 3 ed. Petrópolis: Vozes, 2002.
GLASS, Ruth. London: aspects of change. London: MacGibbon & Kee, 1964.
HAMNETT, Chris. The blind men and the elephant: the explanation of gentrification. Transactions of the Institute of British Geographers, v.16, n.2, p.173-189, 1991. Disponível em:< https://www.jstor.org/stable/622612?seq=1&cid=pdf-reference#references_tab_contents >. Acesso em: 21, out. 2022.

*Ana Beatriz Mascarenhas é arquiteta e urbanista pós-graduada em Gestão Cultural pelo Senac de São Paulo. É mestre pelo programa de pós-graduação em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável da UFMG no qual é doutoranda. É idealizadora, coordenadora e curadora do Festival Cine Identidade & Memória desde 201

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