Sentada à mesa da cozinha ou no alpendre de sua casa no interior, uma avó, Ana Angélica, divide com as netas suas recordações de antigamente. Um momento terno que virou livro de poesia pelas mãos de Lívia Aguiar, que capturou o lirismo das histórias de sua avó e criou poemas-causos que se passam no tempo que o povo “marrava cachorro com linguiça”, a luz vinha do querosene e a mandioca, para ser transformada em farinha, era lavada no rio.
“Histórias do Tempo do Amém” é o primeiro livro da escritora mineira Lívia Aguiar, que sempre esteve ligada à arte e à poesia, se dedicando atualmente também à pesquisa em dança, performance, vídeo e fotografia.
“O livro reúne poeticamente os causos da vida da minha avó. Neles eu tentei manter o ritmo da fala e do sotaque dela, sem que ficasse caricato, e acho que consegui”, conta Lívia, que está feliz com a oportunidade de mostrar o projeto finalizado para a avó, hoje com 85 anos. “Ainda que sejam histórias muito particulares, e talvez exatamente por isso,” reflete Lívia, “ao ler os poemas, cada pessoa é levada para a cidade do interior da própria infância”.
A linguagem usada traz na obra convida o leitor a experimentar os sons e ritmos da vida no campo, onde a chuva e o sol forte se impõem sobre as horas do relógio. Natural de Crisólita, nordeste de Minas Gerais, na região do Vale do Mucuri, Ana Angélica compartilha detalhes de sua infância na roça, personagens reais e hábitos interioranos, utilizando o sotaque de Minas quase Bahia, com expressões bem próprias dos habitantes da região.
A arte gráfica são de Marlette Menezes. Artista, ilustradora e designer nascida em Araxá, homenageada com vários prêmios entre eles o Jabuti (2014, “Lá no fundo do peito” escritor Mauro Martins, e 2009, “O risco do caracol” escritora Maria Valéria Rezende).
“tinha um home que vendia sutiã
ia de casa em casa vendendo
ele tinha vergonha de falar
soutien
aí ele falava
que vendia embornal de cabrito”
“eu não achava Zin bonito
ele era assim que nem nessa foto
o povo diz que ele era bonito
magrelo
não tinha nem bunda
eu sei porque apaixonei com ele
é o destino”
“Zin saiu puxando o pai
o pai dele era muito mulherengo
nem dona Anjinha quis saber dele
largou Seu Eupídio lá em Santa Luzia
e veio pra Crisólita sem ele
Zin saiu puxando o pai dele”
Lívia Aguiar é jornalista, escritora, performer carnavalesca e ativista, como diz ela “da rua, na rua, pela rua”. Nascida em Belo Horizonte, de espírito inquieto já viajou para 27 países e 13 estados brasileiros, morou em São Paulo, Cidade do México e Óbidos (Portugal, em residência literária/2018), hoje vive entre BH e Rio de Janeiro.
Moradora do bairro Floresta, tem Santa Tereza como seu segundo lar. “Santa tereza é meu lugar de muitos afetos: amigos, bares, restaurantes, praças, onde me sinto em casa”, afirma Lívia, que está sempre por aqui e no Carnaval arrasa com suas performances nos blocos pelas ruas do bairro.
Aventura-se pela prosa, crônica, poesia e encontros entre gêneros e se dedica também à pesquisa em dança, performance, vídeo, fotografia e outros lances. Publicou 12 zines de forma independente. Uma delas, Siricotico, é o resultado de performance carnavalesco-poética em um fevereiro interminável de 2019, segundo ela.
Escreveu sobre Istambul no livro “Queria ter ficado mais”, ed. Lote 42 e tem poemas publicados nas zines independentes Dezessete, Dezoito e Vinte e na antologia “70 x Caio”, em homenagem a Caio Fernando Abreu, Ed. Patuá. “Histórias do Tempo do Amém” é seu primeiro livro com ISBN e tudo.
Serviço
Lançamento do livro “Histórias do Tempo do Amém” de Lívia Aguiar com a presença da autora, poetas e performers que irão ler coletivamente as poesias da autora.
Data: dia 24/10, às 15h
Local: Espaço Comum Luiz Estrela, R. Manaus, 348, b. Santa Efigênia
O evento irá cumprir todas as normas de distanciamento social e segurança para que os presentes sintam-se seguros e acolhidos. Não esqueça a máscara.
Onde comprar: https://bit.ly/historiasdotempo (link direto) ou https://quintaledicoes.com.br
