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Marilton Borges uma história de Santa Tereza

Marilton Borges, uma vida em Santa Tereza e de música

O texto ficou um pouco longo, mas vale a pena fazer um esforço e ir até o fim. Palavra de quem escreveu e ficou com dó de cortar… publicada em 30 de maio de 2017 e atualizada em 2021

Geminiano, músico, santaterezense da gema, atleticano e americano, primogênito dos 11 filhos de Maricota e Salomão Borges, casado há 44 anos com Tatá (Maria do Carmo), pai de Bruno e Rodrigo. Este é o Marilton Borges, que completa, neste 31 de maio, 78anos de uma vida muito bem vivida, segundo ele.

Marilton e o famoso piano onde já tocaram os grandes músicos do Clube da Esquina e foram compostas inesquecíveis canções – Foto: Júlia Duarte

E o menino toca nas garrafas

O contato com a música começou aos nove anos. Ele conta rindo que “em frente de casa, havia um murinho, onde eu colocava sete garrafinhas de refrigerante, graduava com água e ficava tocando as musiquinhas com garfo e colher. Vinha gente me ver tocando”.

“Depois o tio João trouxe um cavaquinho e a gente tocava junto. Ai chegou o piano em casa. Comecei a batucar e saí tocando. Fiz umas aulas com a prima Minervina, mas no mais foi por conta própria”, recorda.

54 anos de música

Apesar desse tempo na música, seu primeiro CD, “Do meu jeito”, foi lançado em 2019. Marilton diz que o CD é fruto da amizade e a produção foi do baterista Pingo Balona, que também arcou com os custos. “Eu disse pra ele que era muito caro fazer um CD, mas ele insistiu, que era um presente, o agradecimento por ter ajudado em sua carreira. Foi muita emoção e presente não se recusa. Fiquei muito agradecido”, afirma Marilton.

As 10 faixas são de sua autoria e o CD ele dedicou à família, aos amigos e a quem lhe ajudou, segundo ele, na difícil profissão de músico.

Capa do primeiro e único albúm, Do meu jeito

A vida profissional começou na adolescência: “Tocava e cantava em bares, substituindo os músicos. As músicas em inglês, que não sabia a letra, eu inventava em um inglês próprio. Depois fui pra Gemine 7, a maior banda de baile da época. Ao mesmo tempo estava rolando o Clube da Esquina com o Lô,  Bituca e eu participava algumas vezes. Mas queria apenas ser só músico profissional, diferente da turma que buscava fazer carreira de artista”.

Mudou para o Rio e rodou mundo. “Apresentei shows na Europa e Estados Unidos. No Rio toquei muito, ganhei muito dinheiro e também gastei muito. Solteiro, a gente gasta mesmo, né? Lá ajudei a fundar a Som Livre, onde comecei a produzir algumas coisas.”

Um momento de emoção em sua carreira, segundo ele, foi no Festival Internacional da Canção, em 1972, quando fez back vocal da cantora Maria Alcina, na música Fio Maravilha, de Jorge Benjor, menção honrosa do júri popular. “Imagina o Maracanãzinho urrando e a torcida do Flamengo balançando bandeira. Lá estava o bobão de Santa Tereza assustado e emocionado”

Santa Tereza sempre presente

Ele recorda que “no Rio eu me apresentava à noite, em Ipanema. Acabava o show, corria para o Galeão e pegava o avião de 6h pra BH. Chegava e ia direto pro Bar Barbarella, na Praça pra pegar minha ficha da pelada do futebol. Passava em casa, pegava minhas coisas e ia jogar com a turma”.

Esta rotina foi quebrada, quando sua mãe, Maricota, adoeceu e voltou para ajudar o pai, Salomão, a cuidar dos irmãos menores. “Meu pai falou: meu filho se você não voltar, não vou segurar a onda. Liguei pro Rio e avisei que ficaria aqui pra ajudar a olhar a rapaziada. Tinha uns 20 e tantos”.

Na Praça de Santa Tereza, em 2004, foto de Eugênio Sávio

Ele tentou outras vezes morar na cidade maravilhosa, mas não deu certo. “O Rio é diferente de BH. Aqui você conhece uma pessoa e logo está na casa dela almoçando. Lá as pessoas não interagem, acabou de tocar cada um vai pra sua casa. Eu passava uns domingos esquisitos vendo Silvio Santos.”

Lá ele tocou também na casa 706, substituindo o músico Luis Carlos Vinhas, com o espaço sempre cheio. “Precisei voltar por problemas de saúde do meu filho Bruno. Eles triplicaram meu salário, mas eu disse que não era o dinheiro. Em 79, voltei de vez. Tocando em churrascarias e festas, ganhava a metade do que era no Rio. Mas na vida você deve tomar a atitude que achar correta. Cheguei à conclusão que o Rio não era para mim”.

Marilton (de boné) na Banda Santa com Leilinho Spídola

Foi com a turma do Bar Barbarella, nos anos 1990, capitaneada por Marilton Borges, que surgiu a saudosa Banda Santa. Marilton utilizava a amizade e a paixão pelo bairro de Santa Tereza como vetor para agitar a multidão e imortalizar umas das mais criativas manifestações culturais que o carnaval das alterosas já produziu, a Banda Santa.

Famosa Banda Santa, que teve Marilton Borges com um dos seus idealizadores Foto: arquivo do Marilton

Em cima do Trio Elétrico era possível ver, segundo ele, o povo nas ruas ocupando os espaços públicos e fazendo a festa na base da alegria, da garra, da criatividade e do espírito de coletividade.

Amor Santa Tereza – criação da ADE

“Eu e o Lô somos santaterezenses da gema, porque nascemos em casa mesmo. Quando me casei morei no Santo Antônio, mas sábado e domingo descia pra cá. Jogava “pelada” com a turma, tomava cerveja na praça e depois vinha almoçar com o papai e mamãe” relembra.

Marilton fala sobre a luta para a implantação da ADE (Área de Diretrizes Especiais), na década de 90, quando começaram a construir os primeiros espigões no bairro.

Na época, então Presidente da Associação Comunitária, ele conta que “ia nos gabinetes do vereadores pedir que votassem a favor da ADE. Trazia o vereador aqui, mostrava o bairro. O prefeito era o Célio de Castro e eu insistia para que ele sancionasse a Lei. Teve gente que ficou brava comigo, por achar que com a ADE as casas perderiam o valor, mas aconteceu o contrário. A ADE foi aprovada e Santa Tereza é isso aí”. 

Ele destaca a participação de várias pessoas na luta, entre as quais Nina Herman e o Perdigão, criadores do primeiro Movimento Salve Santa Tereza.

Marilton ´Bar fez história em Santa Tereza – Foto: Eliza Peixoto

Marilton conta que,contratado para tocar em uma festa, lá ficou sabendo que era a casa do dono da construtora MRV. “Uma hora ele me chamou e disse que estava perdendo dinheiro, que eu estava atrapalhando seus negócios. Respondi que meu compromisso é com meu bairro, nasci lá. Ele então insinuou: isso não tem preço? Eu lhe disse não tem mesmo”.

O músico também  manteve o Marilton`s Bar, no Alto dos Piolhos, que foi ponto de encontro de muitos músicos e dos amantes da música brasileira,  durante muitos anos. Junto com outros moradores do bairro foi também um dos fundadores da Banda Santa, que esquentou o carnaval de Santa Tereza, na década de 80.

Aposentadoria

Aos 73 anos decidiu aposentar, depois de, além de ter trabalhado como músico, ter sido funcionário da TV Itacolomi, locutor, diretor da Rádio Inconfidência, produtor musical da Bemol e Som Livre. “Ando numa preguiça danada. Toquei a vida toda por dinheiro, agora só por prazer. Hoje faço música pelo lúdico, é uma farra danada, a gente ri, encontra as pessoas, os amigos vão lhe ver. Sou de uma época em que se tocava toda noite. Antes da pandemia era uma vez por semana, na sexta-feira, no Bar do Museu, com meu filho Rodrigo, o que é um grande orgulho,” diz ele.

Rodrigo Borges e seu pai Marilton no Bar do Museu Clube da Esquina – Foto: Eliza Peixoto

Clube da Esquina

Ele conta que “essa história começou, quando fomos morar no centro, no Edifício Levy, no 17º andar. Acabou a luz e desci pela escada, indo para o trabalho, no correio. Ouvi uma música no 4º andar e era o Bituca. Disse para ele passar lá em casa, onde tem uma meninada que toca violão e piano. Quando voltei Bituca estava na portaria me esperando. Subiu comigo, jantou com a gente e tornou-se o 12º filho dos Borges”.

Telo, Nico (na frente), Marilton, Márcio, Elis Regina, Yè Borges e Lô Borges

Os irmãos músicos de Marilton (Lô, Telo, Márcio e Nico), segundo ele, “dizem que eu os influenciei a seguir na música. Mas acho que eles falam isso para mim, como um prêmio de consolação, por que até hoje eu não gravei um disco. O caso é que tenho uma preguiça que dói. Gravar dá trabalho e você fica sob o jugo dos donos de gravadoras e produtores, não tenho paciência com isso. Sempre preferi tocar na noite, em bailes, bares”.

Marilton em frente ao Ed. Levy, na Av. Amazonas / Foto: Túlio Santos

Ele completa dizendo que “o disco do Marilton é o disco “Os Borges”, em que fiz a produção, os arranjos e coloquei os meninos e até papai e mamãe cantando. Foi um ótimo trabalho.”.

Marilton fala com orgulho do irmão, Telo. “Ele é um dos maiores compositores da música brasileira. Não é porque é meu irmão, mas o Telo faz coisas difíceis e lindas, como a música Tristesse, dele e do Bituca. Acho que ninguém fez uma música tão bonita!”

Telo e Marilton Borges – Foto: Eliza Peixoto

Momento inesquecível

Em sua vida Marilton diz que um momento inesquecível foi a inauguração da placa do Clube da Esquina, na esquina das Ruas Divinópolis e Paraisópolis.

“Estavam todos lá, moradores, autoridades e deram o microfone pra mamãe falar. Ela era simples e de uma franqueza rude. O Bituca estava atrás de mim e disse: isso não vai dar certo. E não deu mesmo. Mamãe falou assim: queridos vizinhos e amigos, os moleques queimadores de fumo, que tocavam na rua e para quem vocês chamavam a polícia, tá todo mundo famoso!” Isso criou um mal estar danado!”, conta ele com sua risada inconfundível.

Disco Os Borges

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